Medo necessário

flickr-3519996014-ifill_960x640

Henrique tem quatro anos e meio e sua irmãzinha seis meses. Houve um período, após o nascimento da menina, em que o garoto ficou inquieto, mais chorão e sem paciência. Passou também a reter a urina, ficava bastante tempo sem ir ao banheiro, acabava molhando as calças e aí se mostrava muito angustiado. Certo dia, diante de uma lanchonete, aproximou-se dele um homem vestido de dragão, com uma fantasia enorme. O garoto ficou apavorado e daí em diante passou a ter medo destas grandes figuras que se movimentam por meio de um ser humano no seu interior. A mãe observa, entretanto, que depois disso ele recuperou certa calma, voltou a ir ao banheiro normalmente…
O nascimento de irmãos, especialmente na faixa etária de nosso protagonista, propicia uma série de dúvidas e temores que surgem quando a criança realiza que o nenê saiu de dentro do corpo da mãe. As questões giram em torno das diferenças sexuais entre homens e mulheres, das separações, evocam os mistérios da vida e, consequentemente, da morte. Os pequenos se perguntam sobre os desejos da mamãe e o papel do papai na família. Portanto, pode-se esperar que apareçam essas angustias vagas que causam mudanças visíveis e incompreensíveis, aquelas que os adultos costumam dizer que são por ciúmes do irmãozinho, pois claramente estão ligadas à chegada dele. 
Henrique não conseguia expressar com pensamentos e palavras sua ansiedade que se traduzia em perturbações generalizadas e na retenção da urina. Quando passou a ter medo dos dragões e personagens afins, concentrou os sentimentos ameaçadores nestas figuras. Agora, bastava evitar esses monstros! 
Podemos levantar a hipótese de que os medos `curaram´ a angustia difusa que o molestava. 
Lembremos que há seculos as histórias introduzem figuras assustadoras na imaginação das crianças. Elas têm a função de cercar as  inevitáveis ansiedades infantis. Mantendo-as presas a esses personagens fantásticos, ajudam os pequenos a terem um bem estar emocional. 
Os pais, preocupados em diminuir o sofrimento dos filhos ou torná-los corajosos, buscam convencê-los de que não estão correndo perigo, `essas criaturas não existem´ ou `bonecos não fazem nada´. Mas convém dar a eles um tempo, deixar que encontrem soluções próprias para seus temores. Podem ser medos necessários…
·

Helena Grinover e Marcia Arantes

Serviços

3 pensamentos sobre “Medo necessário

  1. Noto que algumas das crianças de 2 anos já sentem medo enquanto outras não. Minha filha mesma com 2 anos sabe o que é medo, pois ela vê em estórias fatores que dão medo e observa os personagens e suas feições e de alguma forma ela comenta o assunto, o que acho ótimo. Fico imaginando o que provoca o despertar do medo, pois quando são bem pequeninos parecem não ter; se é angústia da criança transferida, com você sugeriu ou se é trazido por fatores externos, tipo Tv ou cenas reais que podem ser mesmo apavorantes. Obrigada.

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s