
A menininha aos 6 ou 7 anos, tão engraçadinha até então, vira uma pequena tirana. Dá ordens à vontade, enfrenta os adultos com a maior naturalidade, manda e desmanda na casa. Os adultos às vezes riem, outras se constrangem, outras ainda se enfurecem. Como lidar com a situação na qual, até os pais mais controlados, sentem-se impelidos a usar de força, como se estivessem num ‘braço de ferro’ com a filha
Ao lado disso, outras mudanças estão ocorrendo: a distinção entre realidade e fantasia se fortalece, a menininha já sabe que algumas estórias são inventadas e outras são de verdade; os dentes de leite começam a cair e com eles a carinha de bebê; as exigências escolares aumentam e as expectativas em relação ao comportamento também.
Grande batalha enfrenta essa menina! Suas crenças estão abaladas, até seus dentes estão abalados! A visão que tem sobre seus pais também está em mudança. Eles diminuem de tamanho e ela cresce, já começa a vislumbrar que um dia estarão do mesmo tamanho.
Essa descoberta encorajadora, é também o abalo da proteção inquestionável que os pais representam durante os primeiros seis anos de vida.
Ela já tem quase certeza de que a vida não é um conto de fadas, está perdendo a ilusão da força das varinhas mágicas e ao mesmo tempo ainda não é uma mulher como sua mãe, sua professora. Como conseguir então ser alguém importante, como realizar seus desejos, como ter controle sobre esse mundo que se apresenta complicado e inatingível?
O que aparece como malcriação pode ser visto como tentativa um pouco desesperada de se sobrepor, de recuperar o poder representado pelas ‘Cinderelas’ que magicamente vencem todas as dificuldades e tornam-se ‘felizes para sempre’ com seus príncipes e vassalos…Se isso agora não pode mais ser conseguido com varinhas ou beijos de amor, quem sabe se na ‘base do grito’ a coisa funciona?
Mais do que ser enfrentada, a menininha precisa ser ajudada a encontrar maneiras de se relacionar sem ocupar o lugar de ‘sua majestade’, tampouco o de ‘seu vassalo’.
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Marcia Arantes e Helena Grinover